domingo, dezembro 03, 2006

Opinião

Carta a um poeta

Meu caro amigo Marcos Ferreira,

Como não poderia ser diferente, vou começar com uma frase roubada. Sim! Já esqueceu que sou um ladrão de citações, titulo este que faço questão de conservar? Afinal, no Brasil, quanto maior o furto, o roubo, mais as pessoas são queridas, adoradas, eleitas...

Pois bem! Roubei a frase de nada mais nada menos do que de São Tomás de Aquino. E não se preocupe, pois o santo não vai ficar com raiva não: entrei num acordo com ele antes. Vamos ao que interessa?

São Tomás de Aquino, certa vez, afirmou: “Se o mal existe, Deus existe”. Como você está sendo vítima de um mal, aí na nossa Mossoró – a “Capital Cultural do Estado”, achei a frase pertinente e oportuna. Concorda? E olha, Marcos, esse mal não é de hoje não. E você entenderá logo, logo...

Dizem que o sofrimento alheio alivia o nosso... por isso vou contar uma história que aconteceu há quase quarenta anos: Nasci em 26/05/1966 e, com três meses de idade, perdi meu pai num trágico acidente nas areias de Tibau. Essa tragédia, além de vitimar meu pai, deixou de saldo uma viúva de 24 anos, com mais três filhos para criar, tendo o maior deles apenas 05 anos de idade. Então, já deu pra perceber que a minha mãe teve que ralar muito. E bote muito nisso, meu caro amigo Marcos.

No entanto, lá na nossa Mossoró – a “Capital Cultural do Estado”, ela não conseguia emprego, pois era considerada uma “criminosa”. Qual o crime dela?! Minha mãe, além do seu crime, Marcos – pois não é crime pensar e falar em Mossoró? –, tinha outro delito também: fazia parte das “Senadoras” e estava encantada por um cigano feiticeiro que tentava espalhar uma tal de esperança verde no nosso Estado. E a cor verde em Mossoró era (e ainda é) crime também, não é, meu caro amigo Marcos?

Toda essa perseguição fez com que minha mãe arrumasse as malas e viesse para Natal, tentar uma melhor sorte. Só não passamos fome, meu caro Marcos, porque Deus (veja que ele começa a aparecer na história: “Se o mal existe, Deus existe”) colocou um anjo, minha tia Zilda Lopes, no nosso caminho.

Embora, mudando de caminho, a “caça à criminosa” continuou. É, Marcos, minha mãe foi impedida de assumir um emprego de professora numa escola pública da capital, pois continuava cantando: “cigano feiticeiro, feiticeiro ai meu Deus...”. Hoje, passados todos esses anos, ela é uma professora aposentada da UNB e vive lá em Brasília (fazer o que: existe gosto para tudo...).

Calma! Ainda não acabou. Agora é que vai começar o mais impressionante dessa minha história. E veja como Einstein estava errado ao dizer que Deus não joga dados. Claro que Ele não só joga, como esconde os dados também. E Ele escondeu o melhor dessa história, para ser contada, quando eu estava no terceiro ano do Curso de Medicina. Era uma bela tarde de calor do mês de março. Estava no auditório João Machado, do Hospital Universitário, quando entra um “coração” enorme, vestido de branco, por trás de uns óculos fundo de garrafa.

Abriu um sorriso e disse: “Sejam bem vindos, à primeira disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental (IDCC)! Meu nome é Ernani Rosado”. Sim, Marcos, Deus mostrou que não há um mal que não traga um bem. Esse senhor – depois vim saber, tinha sido amigo de meu pai – cativou-me, com a sua aula magistral sobre “História da Cirurgia”.

Assim, passei a acompanhar as cirurgias da disciplina até tornar-me professor da IDCC e ser seu auxiliar também. Com o Doutor Ernani, aprendi que simplicidade e humildade poderiam viver lado a lado com inteligência e competência; que a caridade é a principal meta do médico; que fazer amigos e cativar pessoas é preciso, mas viver não é preciso (Nunca o vi falar mal, nem impedir o crescimento de ninguém. Ainda, hoje, é considerado o professor que mais tem influenciado os alunos do curso médico da UFRN) Enfim, foi com ele que aprendi a valorizar o ser humano.

Veja então, meu caro amigo Marcos: não se irrite com os seus perseguidores, pois toda bondade da família ficou mesmo reservada para o meu mestre e por que não dizer: meu pai adotivo nos tribunais do coração... e se Allan Kardec tem mesmo razão em classificar os espíritos em graus de perfeição, sem dúvida, os imperfeitos ficaram todos na nossa querida Mossoró – a “Capital Cultural do Estado”.

Esses espíritos, que dominam a cidadela mossoroense, pertencem à terceira ordem e se acham na parte inferior da escala, por isso são ignorantes, desejam o mal e fazem de tudo para retardar o progresso. Na verdade, eles vivem num inferno, pois são incapazes de amar. São incapazes de perceber a sua grandeza e a sua genialidade (meu amigo, não consigo parar de ler aquele seu texto “A hora do crepúsculo”, que você fez todo sem utilizar um único verbo sequer. Não precisa dizer como você conseguiu: sei que é coisa de gênio mesmo).

Portanto, Marcos, você é grande demais para se deixar abater pela mesquinhez deles: levante, sacuda a poeira e dê a volta por cima! E Fique tranqüilo, pois sua legião de amigos estará ao seu lado. Você verá que São Tomás de Aquino tem razão...

Um forte abraço!

Do seu Edílson Pinto

P.S. Ih! Já ia esquecendo: Você está intimado a comparecer aqui em casa. Só que dessa vez, não vai ficar apenas no guaraná não! Estou reservando um bom vinho para brindarmos o seu sucesso: o prêmio no concurso de poesia lá em Manaus. Qual o vinho? Sim! Pode até ser Rosé, pois “Se o mal existe, Deus existe”.

Francisco Edílson Leite Pinto Junior – Médico e professor da UFRN

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