O delírio do turismo e os filhos de Esparta
O jornalista Cassiano Arruda noticiou em sua prestigiosa coluna, domingo, 31 de dezembro/2006, em “O poti”, que a prefeita Fafá Rosado (PFL) participará em fevereiro de uma feira de fruticultura na Alemanha, abrindo caminho para o “turismo internacional” em Mossoró. Com todo respeito: o jornalista só conhece essa cidade pela propaganda oficial e relatos de bem-aventurados. Ligando a TV, a pátria mossoroense aparece como ambiente idílico e surreal.
Na boa terra não existe sequer linha aérea semanal; raramente se encontra um restaurante aberto além das 23h; o museu há mais de quatro anos está destroçado (quase fechado); a capela histórica de São Vicente só abre em dia de Missa ou para velório de bacana e não temos uma única casa de câmbio. Num raro espaço de venda de produtos típicos, denominado de “Arte da terra”, tem de tudo - vatapá (afro-baiano), crepe (suíço), hot-dog (norte-americano) etc -, menos culinária nativa.
De cosmopolita só possuímos o movimentado cabaré do “Anjo Gabriel” e o tráfico/consumo de crack e cocaína, de fazer inveja a Natal. Até para o “turismo sexual” estamos em baixa, com tanta mulher fazendo programa de graça mesmo. Dão por prazer, digamos assim, causando um dumping nos negócios profissionais.
Por outro lado, começo a desdizer tudo que escrevi acima. Talvez possamos faturar em cima dos gringos como a cidade com maior número de espetinhos por metro quadrado do mundo.
Tem mais: somos a única cidade que promove “reveillon” três dias antes da data correta (31 de dezembro); a única que realiza Carnaval somente na sexta-feira que antecede o período de momo; a única que comemora emancipação política intencionalmente em data incorreta; a única que vai erigir memorial em honra aos bandidos que tentaram saqueá-la há quase 80 anos, além de sermos a única em que todos os membros de uma mesma família já nascem ‘vocacionados à política’ e com ‘competência’ para o serviço público.
Mas alerto, que por pouco Mossoró não obtinha um feito ainda mais inusitado: o de realizar um “Oktobeer Fest” no mês de dezembro. Perdemos essa por pouco em 2006. Porém, em 2007, a gente consegue essa nova marca incomum.
É preciso que as pessoas de bem e conscientes resgatem Mossoró das trevas. Ela está imersa numa Idade Média temporã. Há anos que milhares de jovens migram para outros centros em busca de oportunidades. Seus pais se sacrificam para lhes oferecer futuro mais digno, desiludidos com o modelo de seleção estabelecido por uma elite dominante, incapaz de pensar além dos interesses dos quatro cantos da própria casa.
Garotos ainda imberbes viajam para uma temporada de estudos em Natal, Fortaleza, Campina Grande etc, mas terminam virando as costas à sua terra-berço. Descobrem que na sociedade mossoroense, o Sol nasce para todos, mas a sombra e água fresca cabem – com exceções - à turma “da gente” e aos que topam se anular, num servilismo passado de pai para filho, como se fora herança milenar de castas indianas. Quem reagir é tratado como débil, insolente, anarquista ou recalcado.
Exportamos nosso capital intelectual e força renovadora de trabalho para outros centros, como se a salvar a espécie. O efeito dessa fuga é uma óbvia estagnação social, empobrecimento per capita do grosso da população e escassez de referências humanas, afetando todos os setores de Mossoró. Estamos cada dia menores. Em Esparta, aos 7 anos, meninos eram entregues à cidade-estado para virarem guerreiros em sua defesa. Nós fazemos diferente: doamos os nossos adolescentes para serem soldados em outras pátrias. A maioria não retorna sequer para final de semana ou veraneio “em Tibau”.
Por aqui vão ficando os que não podem “escapar”, os teimosos (como eu) e a porção que está se dando bem.
Diversos filhos e agregados dos poderosos que residem longe, nem precisam voltar a Mossoró para relembrar o lado bom da terrinha e simularem seu civilismo e amor telúrico: basta passar mensalmente o cartão funcional no caixa eletrônico. Assim exaltam - à distância - o quanto adoram a Mossoró da gente.
PRIMEIRA PÁGINA
PT – Dirigentes estaduais do PT e a governadora Wilma de Faria (PSB) reúnem-se hoje à tarde. Em pauta, a formação da equipe de governo na segunda gestão de Wilma. Os petistas não querem apenas o topo de uma secretaria, a da Saúde, por exemplo. O leque de pleitos vai mais longe. A governadora enxerga, na pressão velada, um primeiro passo para pavimentar caminho à disputas futuras, que podem conflitar com sua vontade. Leia-se aí a Prefeitura de Natal com a deputada federal Fátima Bezerra (PT), que pode ser a candidata do petismo, mas não de sua preferência. Elementar.
SERIDÓ – O deputado estadual Vivaldo Costa continuará na Assembléia Legislativa. É essa a informação que colho dos intramuros da governadoria. A governadora teria fechado questão e para viabilizar a permanência do ‘Papa’ na Assembléia, atrairá a deputada titular Larissa Rosado (PSB) para o secretariado, na pasta ‘mais leve’ da Ação Social.
DIVISÃO – A oposição ao prefeito apodiense José Pinheiro (PMDB) aposta na cizânia existente no governismo, como um dos fatores decisivos à vitória na disputa municipal de 2008. Em Apodi, a política ferve 24 horas/dia. Mas a própria oposição não está fechada em torno de nenhum nome. Quem desponta com maior agilidade até aqui, articulando apoios que viabilizem uma aliança homogênea, é a médica Solange Noronha. No wilmismo, ela conta com crescente incentivo. Porém, não chega ainda a ser consenso entre oposicionistas em Apodi. Eis a questão.
LONGE – Noticiei aqui em primeira mão, à semana passada, a reunião entre o ex-prefeito de Pau dos Ferros Nilton Figueiredo, acompanhando o deputado estadual Raimundo Fernandes, com a governadora Wilma de Faria. A perspectiva era de que Nilton fosse convocado para ser secretário de Esporte e Lazer, cargo que já exerce na Prefeitura de Natal. Relatei ainda, que o próprio Raimundo prometera que se fosse reeleito, “Nilton será secretário de Estado”. Mas as informações que transpiram da capital não corroboram com isso. A princípio, Nilton deverá permanecer na pasta da capital.
GERAIS
- Mossoró sepultou na manhã desta quarta, 3, um de seus mais antigos comerciantes, o senhor Raimundo Marques (Comarques). Faleceu ontem.
- O Sindicato dos Radialistas de Mossoró e Região promoveu uma maldade adicional à família e amigos do associado J. Keuli, da Rádio Princesa de Assu, falecido ontem. Em nota publicada na imprensa, hoje, a entidade “congratula-se” pela morte do comunicador. Tenham dó, por favor.
- O enorme prédio onde há décadas funciona a indústria Socel (moagem de sal), do ramo familiar da prefeita Fafá Rosado (PFL), finalmente sairá da zona urbana de Mossoró. É a última empresa do setor a pegar o rumo de área fora do centro urbano. Em seu lugar nascerá um condomínio vertical, que será muito valorizado pela proximidade com a urbanização da Avenida Rio Branco, obra da municipalidade em consórcio com Estado.
- “Fortaleza dos Reis Magos: O Marco da História Potiguar”. Esse o título da exposição oficial em Natal, no Forte dos Reis Magos, que começa na sexta, às 9h.
- Obrigado à leitura deste Blog ao advogado José Rego Júnior, escritor Ney Leandro e ao economista Nilson Gurgel.
SÓ PRA CONTRARIAR
Wilma de Faria não vai nomear ninguém para devorá-la adiante. Anote.
14 comentários:
Que o diga tentar se alimentar no dia 1º de janeiro! Uma verdadeira via-crucis...
"O delírio do turismo" é algo fantástico.
Parabéns!
Um grande abraço.
Prezado Carlos Santos,
Acompanho em silêncio sua atuação jornalística. Excepcionalmente deixo a reserva para, desta feita, dirigir-me a você. E o faço para elogiar o artigo com o título "O delírio do turismo e os filhos de Esparta". O texto elucida, limpa as lentes, tira o véu. Alerta sobre a precariedade do reino e a nudez do rei, digo, da rainha.
Parabéns.
Grato,
Antônio Alvino da Silva Filho
Meu caro Carlos Santos, mesmo distante das lides jornalisticas de Mossoró e dedicando-me à advocacia há alguns anos junto a Justiça Federal do Rio Grande do Norte, sempre estou a acompanhar a sua página na internet e saber de tudo sobre a política desse estado da federação. Continuo admirando-o pelo excelente jornalista que sempre soube ser .
josé maria alves
Carlos, o que você relata é o drama de centenas de pais mossoroenses, que se sacrificam para mandar os filhos embora desse lugar, apesar do amor que sentimos por Mossoró. Aqui só tem vez os filhos desse povo, a maioria filhinhios do papai, cheios de dinheiro e que nao estao acostumados a trabalhar. Mandei os meus para Natal e nao me arrependo. Lá eles não sáo perseguidos ou ajudaods por políticos. Vao vencer com as prooprias forças. Francisco Silvestre M. Silva
Seu texto de hoje está insuperável, pois é a maior realidade sobre mossoró. Nossa cidade só serve para uns poucos.
Se eu nao o conhecesse tão bem, sabneopndo quanto você ama Mossoró, ficaria com raiva de tanta dureza escrita nesta coluna. Mas o pior é que é tudo verdade. Doi mas é verdade. Mossoró está empobrecida e os melhores inteligências nao ficam na cidade, vao embora para Natal, fortaleza e mais longe.
Alberto antônio Trindade da Rocha
Sem oportunidades em Mossoró, quem pode sai da cidade e náo tem motivos para voltar. Carlos Santos, nunca voc6e escreveu tantas verdades. Chorei lendo alguns trechos aqui tão longe, mas meu sofrimento maior é porque sei que tudo é verdade. Estou em brasília há mai s de quinze anos e cada vez mais percebo, lendo você, que o quadro eé ainda pior do que antes.
Maria Renato Figueredo
Estou em Fortaleza, estudei no Diocesano e sai para estudar fora querendo voltar para servir a minha cidade. mas nas vezes em que fui passar férias, conversando com amigos, nao vendo perspectivas para nada e a mesma politica suja, resolvi que nao tinha o que fazer mais na minha cidade. Em breve estarei indo morar e trabalhar em Curitiba (PR). Mossoró nao vai melhorar enquanto meia dúzia de pessoas continuarem trabalhando só para enriquecer a própria família.
Antônio Júnior
Daqui de Manaus tenho lido você diariamente, desde que uma amiga indicou a leitura. Hoje bateu uma saudade de Mossoró, mas ao mesmo tempo senti uma dor imensa, por saber que o que você está relatando em sua reportagem de hoje, é a arealidade que ouço de meus amigos e amigas que icaram aí. Sai com 18 anos e hoje estou com 25. Aqui se fala em politica 24 horas por dia, mas nao é com essa sujeira que existe aí, prejudicando quem nao vota numa família ou está com o poderoso do palácio. Quem sai de mossoró descobre outro mundo e percebe como estamos atrasados.
Rita A, Soares
Caro Carlos Santos:
Parabéns pelo excelente artigo. Não poderia esperar coisa diferente de uma mente previlegiada e um talento invulgar que Mosssoró não pode se dar ao luxo em perder. Um artigo candente, duro, porém verdadeiro, sem perder a ternura, como dizia Guevara.
Tenha certeza que não pregas no deserto e Mossoró não é nehuma Salomé. Muitos ouvidos mossoroenses te escutam, não estão moucos.
A dinastia dos Corados, já na quarta geração, e seus agregados(cunhados, genros, maridos) que suga a cidade a quase um século, conseguiu ao longo dos anos criar uma ideologia de que somente eles servem para Mossoró. Não é sem próposito que tentam desqualificar a decisiva ação de nomes fundamentais da nossa história, mas que não tem o sobrenome da dinastia, como é o caso do grande prefeito Rodolfo Fernandes, que com sua coragem e tenacidade conseguiu repelir a tentativa de um bando sanguinário de assenhorear-se de nossa Urbe. Glamourizar estes facínoras em nada contribui para o nosso engrandecimento.
É bom constatar que Mossoró tem filhos que não fogem à luta. Verás que existe um número muito maior do que imaginas de pessoas que, verdadeiramente, adoram Mossoró.
Um forte abraço.
Assis Costa
Carlos Santos, a classe política que temos não quer o nascimento de um nível intelextual melhor, de uma juventude apaixonada e interessada em trabalhar por mossoró. Quanto pior é que é melhor. Eu moro em Natal e depois vi que era para ter saído a mais tempo com meus filhos. Aqui nao tem político para ajudar nem atrapalhar. Tudo depende de cada um progredir ou nao.
O maior delírio que mossoró vive é o do circo, cheia de festa e pobreza. QUem puder que tire seus filhos daí,cmo eu e meu marido fizemos.
Cïntia Rodrigues - João Pessoa
Esse seu comentário sobre o turismo mossoroense, deveria ser copiado, impresso em panfleto e atirado do alto sobre a cidade, para que toda população tivesse acesso e pudesse exercitar um pouco a consciência. É uma obra de arte sobre as "artes" que andam praticando em nossa amada Mossoró. Para tristeza geral da nação, pura e dolorosa verdade.
Postar um comentário